quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Sermão do mandato


O primeiro remédio que dizíamos, é o tempo.Tudo cura o tempo,tudo faz esquecer,tudo gasta,tudo digere,tudo acaba.Atreve-se o tempo a colunas de mármore,quanto mais a corações de cera?São as afeições como a vida que não há mais certo sinal de haverem de durar pouco,que terem durado muito.São as linhas que partem do centro para as circunstâncias,que quanto mais continuadas,tanto menos unidas,por isso os antigos sabiamente pintaram o amor menino,porque não há amor tão robusto que chegue a ser velho.De todos os instrumentos com que o armou a natureza,o desarma o tempo.Afrouxa-lhe o arco,com que já não atira,embota-lhes as setas,com que já não fere;abre-lhe os olhos com o que vê e o que não via e faz-lhe crescer as asas com que voa e foge.A razão natural de toda essa diferença é porque o tempo tira a novidade às coisas,descobre-lhe os defeitos,enfastia-lhe o gosto e basta que sejam usadas para não serem as mesmas.Gasta-se o ferro com o uso,quanto mais o amor?O mesmo amor é causa de não amar,e o ter amado muito,de amar menos.
(Antônio Vieira)

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